Não toqueis nos meus ungidos, nem maltrateis os meus profetas
(1 Crônicas 16.22; Salmo 105.15)
Muitas vezes, ao longo dos anos, esse versículo bíblico tem sido usado para a autodefesa de pastores que, por vezes, estão mais dispostos a abusar das ovelhas e enriquecer-se às custas delas do que cuidar das mesmas com a sua própria vida. Bastava algum comentário a respeito do pastor que logo alguém já citava o versículo “Não toqueis nos meus ungidos”, por vezes acompanhado da história do que a ursa fez com os meninos que chamaram Eliseu de careca. Em alguns ambientes a situação ainda é assim, em outros, o extremo oposto tem acontecido.
Se por um lado existem pastores estrelas, autonomeados apóstolos que se enriquecem às custas da pele das ovelhas, por outro lado tem sido muitíssimo comum, especialmente em igrejas conservadoras, que existam pastores considerados apenas funcionários de suas igrejas, que são repetidamente humilhados, desvalorizados e abandonados. A depressão em pastores tem sido comum, ainda que oculta e silenciosa, pois os pastores tentam manter a aparência de força e espiritualidade para manter a posição para sobreviver.
A verdade é que os pastores não são exatamente como os profetas do Antigo Testamento e todos os cristãos são ungidos: profetas, sacerdotes e reis. Mas também é verdade que os pastores são os homens escolhidos por Deus para abençoar a sua igreja de maneira especial. Em Efésios 4.11-14, Paulo fala que os pastores-mestres são um presente de Deus à igreja para o aperfeiçoamento dos santos, o bom desempenho do seu serviço, o seu desenvolvimento em direção à maturidade cristã. Os pastores expõem a palavra (1Tm 4.6), salvam seus ouvintes pelo cuidado com a doutrina (1Tm 4.16), exortam (animam, aconselham, repreendem) pessoas de todas as idades e tipos (1Tm 5.1-2; 6.17-19; Tt 2.15), prescrevem o que os cristãos devem fazer (1Tm 5.7), guardam a verdade (2Tm 1.13-14) e têm que manejar bem a palavra da verdade (2Tm 2.15).
Além disso, paira sobre cada um deles a ordem que Paulo deu a Timóteo:
Na presença de Deus e de Cristo Jesus, que julgará todos os seres humanos, tanto os que estiverem vivos como os que estiverem mortos, eu ordeno a você, com toda a firmeza, o seguinte: por causa da vinda de Cristo e do seu Reino,pregue a mensagem e insista em anunciá-la, seja no tempo certo ou não. Procure convencer, repreenda, anime e ensine com toda a paciência.Pois vai chegar o tempo em que as pessoas não vão dar atenção ao verdadeiro ensinamento, mas seguirão os seus próprios desejos. E arranjarão para si mesmas uma porção de mestres, que vão dizer a elas o que elas querem ouvir.Essas pessoas deixarão de ouvir a verdade para dar atenção às lendas. Mas você, seja moderado em todas as situações. Suporte o sofrimento, faça o trabalho de um pregador do evangelho e cumpra bem o seu dever de servo de Deus. (2Tm 4.1-5, NTLH)
Imagine a qualificação pessoal, acadêmica, profissional e, mais importante do que tudo isso, espiritual, que alguém tem que ter para desempenhar bem todas essas funções? É por isso que a Bíblia ensina que os pastores têm que ser bem pagos! No entanto, enquanto a Forbes alista os cinco pastores mais ricos do Brasil e, de fato, muito enriquecem às custas do povo de Deus, a verdade é que muitíssimos pastores recebem muito menos do que as igrejas deveriam lhes pagar, por causa de seu árduo trabalho. Essa é a instrução bíblica:
Os presbíteros que fazem um bom trabalho na igreja merecem pagamento em dobro, especialmente os que se esforçam na pregação do evangelho e no ensino cristão. Pois as Escrituras Sagradas dizem: “Não amarre a boca do boi quando ele estiver pisando o trigo.” E dizem ainda: “O trabalhador merece o seu salário.” Não aceite nenhuma acusação contra qualquer presbítero, a não ser que ela seja feita por duas testemunhas, pelo menos. Repreenda publicamente os presbíteros que cometem pecados, para que os outros fiquem com medo. (1 Timóteo 5.17-20, NTLH)
Paulo escreveu sua carta ao jovem pastor Timóteo para dizer a este o que ele deveria ensinar à igreja de Éfeso. Entre diversas instruções, Paulo ensinou também como a igreja deveria tratar os seus presbíteros docentes e regentes e nós podemos e devemos aprender com essas instruções. Pastores, vocês tem que ensinar as suas igrejas como é que elas devem tratar os pastores!
Aprendemos no verso 17 que os presbíteros da igreja são merecedores de salários dobrados, ou pagamento em dobro. Isso mostra que na época da Bíblia era comum que não somente os pastores vivessem do ministério, mas também os presbíteros regentes. Ou seja, o trabalho de cuidar da igreja de Cristo Jesus é tão árduo, sério e exigente que é totalmente justo aos olhos do Senhor que um presbítero receba salário, e salário bom, nas palavras de Paulo, um salário dobrado. Quanto àqueles que são presbíteros docentes, a quem normalmente chamamos de pastores, merecem salários dobrados e especiais. Ou seja, nós como igreja, devemos ter prazer em pagar bem os nossos pastores e, se possível, deveríamos pagar também os nossos presbíteros que se dispusessem a ser presbíteros de tempo integral. A argumentação de Paulo para fundamentar o seu ponto vem de Dt 25.4 e de Lc 10.7 e aponta que o ministério pastoral é um trabalho árduo e digno de um salário honroso.
Mas não adianta pagar muito bem o pastor e tratá-lo de maneira não honrosa:
Mas aquele que está sendo instruído na palavra faça participante de todas as coisas boas aquele que o instrui. Gálatas 6.6
Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram… Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros. Hb 13.7, 17
Imagine o peso de cuidar da alma de pessoas (o bem mais valioso e eterno de cada um de nós) como quem terá que explicar a Deus o trabalho que fez com cada uma delas? É por isso que Paulo, depois de alistar todos os seus sofrimentos como apóstolo, acrescenta ainda: “Além dessas e de outras coisas, ainda pesa diariamente sobre mim a preocupação que tenho por todas as igrejas” (2Co 11.28). É por isso que os pastores merecem receber o carinho, atenção, zelo e cuidado por parte de suas ovelhas.
Cristão, não faça o seu pastor participante apenas das tragédias e problemas, mas também das coisas boas (Gl 6.6). Lembre-se daqueles pastores que estão idosos ou já morreram (Hb 13.7), não os abandonem e esqueçam como se fossem instrumentos usados que não servem mais. Que júbilo há não poder trabalhar e ficar esquecido depois de ter se gastado tanto pela noiva de Cristo? Obedeçam e sejam submissos aos ministros da palavra a fim de aliviarem uma carga já pesada demais (Hb 13.17).
Portanto, os pastores são os servos escolhidos de forma especial por Deus para liderar, cuidar e edificar o povo de Deus. São os principais portadores da palavra de Deus (profetas). Recebem de Deus um dom especial para exercerem os seus ministérios (ungidos). A palavra diz que eles devem ser cuidados de maneira especial, julgados de maneira especial e punidos de maneira exemplar, quando esse for o caso. Assim sendo, tudo sendo entendido da maneira correta, não vejo problema em usar este texto para ensinar a igreja a respeito dos pastores: “Não toqueis nos meus ungidos, nem maltrateis os meus profetas”. Que o Senhor ajude as igrejas a cuidarem melhor de seus guias.